Órfãos na 3ª idade

"O ritmo de vida actual afasta a família dos idosos que, por sua vez, se sentem mais marginalizados"

Nesta bela Europa, o velho é um empecilho de cabelo oleoso no meio da lavadinha família modernaça. Por isso, ninguém nota que a gripe normal mata, todos os anos, uma multidão de velhos. Ano após ano, estas mortes não causam qualquer emoção mediática.
Nós, os modernaços europeus, damos 100% de atenção às crianças, e 0% de carinho aos velhos. Depois, no dia-a-dia, esta aritmética afectiva provoca vilanias. Em 2003, por exemplo, centenas de velhos morreram de calor por essa Europa fora. Não havia ninguém para lhes dar um copo de água. Um copo de água. Estas mortes não geraram uma discussão 'europeia'. A tal discussão só surgiu quando, anos depois, uma menina - uma só - desapareceu no Algarve. Aí, sim, toda a Europa, em histeria continental, reflectiu sobre a pedofilia.

Dentro desta assimetria dos afectos, comum a toda a Europa, Portugal destaca-se com afinco. Em Paris, foi descoberto o corpo de um velho que estava morto há dois anos na sua própria casa. O velho era português, mas isto não causou um cêntimo de indignação entre nós. Em Portugal, só se pode falar de outra menina, coitadinha, que foi para a Rússia. No nosso mercado da indignação, uma menina retirada aos pais 'afectivos' vale mais do que um velho abandonado a uma morte desumana.

Quando olham para a forma como tratamos os velhos, os chineses sentem um justo nojo. Por uma vez, os chineses têm razão.
Texto publicado na edição do Expresso de 31 de Outubro de 2009Henrique Raposo (www.expresso.pt)


Comentários

  1. Não é só na Europa. Aqui no Brasil é a mesma coisa. O idoso não é respeitado

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  2. Gi...
    Penso que o problema é mundial. E também tem a ver com o ritmo de trabalho que nos é imposto. É muito stress e sobra pouco tempo para os outros. Tem também a ver com valores. E esses são cada vez mais escassos.
    Bjs

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  3. margarida
    já nem sei. esses valores nós incutimos, mas a sociedade encarrega-se de os eliminar. é esse o meu medo. Não tenho,medo da velhice, tenho sim medo do que a velhice traz: a solidão, a dependencia, os medicamentos, o esquecimento da parte da familia, as doençass, a maçada (como diz minha tia)mas acima de tudo o abandono da pessoa na porta do hospital e fingir que não a conhece.Meu Deus! Há 120 idosos abandonados no hospital

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  4. Esta tristeza já não acontece nos paises africanos, onde o velho e a criança são respeitados 100%.

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